terça-feira, 5 de agosto de 2014

Patriotismo e nacionalismo

Discuta com a turma os conceitos de nacionalismo e patriotismo, comparando suas manifestações pelo mundo

Objetivos
Identificar versões extremadas de sentimentos como patriotismo e nacionalismo


Conteúdos
Patriotismo, nacionalismo, cidadania


Tempo estimado                  Duas aulas


Introdução
O artigo Patrulha Labial, de Roberto Pompeu de Toledo, trata, entre outros aspectos, da diferença de opiniões de autoridades francesas sobre a suposta resistência de jogadores da seleção de futebol a cantar a Marselhesa - o hino nacional do país. A ministra francesa dos Esportes considera que os jogadores deveriam fazê-lo; já a vice-ministra, negra, nascida no Senegal, afirma que exigir isso "seria uma espécie de ditadura". Será que depois do famigerado "Brasil: ame-o ou deixe-o", temos agora "Marselhesa: cante-a ou deixe a seleção"?
Em outro contexto, o artigo O novo país do futebol trata da expressão do nacionalismo que ressurge na Alemanha, em um contexto de potência econômica europeia e de seleção campeã da Copa do Mundo. Não é o mesmo caso do III Reich, que levou à eclosão da Segunda Guerra Mundial. Hoje, o pensamento é de coletividade e receptividade ao multiculturalismo. Use os textos como base para examinar com seus alunos sentimentos como nacionalismo e patriotismo, cujos excessos colocam em xeque a unidade nacional.


Desenvolvimento
1ª aula
Solicite que os estudantes pesquisem em dicionários e livros o significado dos termos "patriotismo" e"nacionalismo". Eles vão constatar que patriotismo é o sentimento daquele que ama a pátria ou a ela presta serviços. Já o vocábulo nacionalismo tem várias acepções: 
1.   Salvaguarda dos interesses e exaltação dos valores nacionais; 
2.   Sentimento de pertencer a um grupo por vínculos raciais, linguísticos e históricos, que reivindica o direito de formar uma nação autônoma; 
3.   Ideologia que enaltece o estado nacional como forma ideal de organização política, com suas exigências absolutas de lealdade por parte dos cidadãos.

Forneça, a seguir, algumas informações sobre manifestações extremas desses sentimentos, tais como o chauvinismo, o jingoísmo e o ufanismo.
Ø
Chauvinismo - é definido nos dicionários como "patriotismo fanático, cego, agressivo". A palavra deriva do nome de Nicolas Chauvin, veterano aposentado que permaneceu fanaticamente devoto a Napoleão depois da derrota do imperador em Waterloo, em 1815. A figura do velho militar deu origem a um personagem ridicularizado em peças como La Cocarde Tricolore, dos irmãos Charles-Théodore e Jean-Hippolyte Cogniard.

Jingoísmo - versão britânica do chauvinismo, ainda mais arrogante e agressiva. Felizmente, os próprios britânicos criaram um antídoto para o jingoísmo, nas palavras mordazes do escritor Samuel Johnson: "O patriotismo é o último refúgio de um canalha".

Ufanismo - segundo os dicionários, trata-se do "orgulho exacerbado pelo país em que nasceu; patriotismo excessivo". O termo remete ao livro Por que me ufano de meu país, do conde Afonso Celso, publicado em 1900. Elencando itens da superioridade do Brasil como a grandeza territorial, a beleza e o "procedimento cavalheiroso" e digno para com os outros povos, o autor faz afirmações questionáveis como: "Negros, brancos, peles-vermelhas, mestiços, vivem aqui em abundância e paz". Outras são francamente absurdas, como "Feridas e amputações cicatrizam mais depressa do que nos hospitais do Velho Mundo". Ou ainda, "No Amazonas (...) as onças (...) são inofensivas. Serpentes gigantescas guardam as cabanas". 

Chame a atenção para um outro conceito de pátria, dinâmico, livre dos exageros chauvinistas ou ufanistas. Ele pode ser expresso nas palavras do poeta Fernando Pessoa em Minha pátria é a língua portuguesa.
"Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. Mas odeio, com ódio verdadeiro, com o único ódio que sinto, não quem escreve mal português, não quem não sabe sintaxe, não quem escreve em ortografia simplificada, mas a página mal escrita, como pessoa própria, a sintaxe errada, como gente em que se bata, a ortografia sem ípsilon, como o escarro direto que me enoja independentemente de quem o cuspisse" (Fernando Pessoa, Livro do Desassossego)
Peça que os alunos leiam o artigo de Roberto Pompeu de Toledo, publicado em VEJA, que menciona os "times multicoloridos" da Europa que disputaram a Copa do Mundo da África do Sul. Leiam juntos também o artigo de Tatiana Gianini, O Novo País do Futebol, e identifique com os alunos os trechos que mostram como a Alemanha adotou como caminho uma receptividade maior aos imigrantes e mudou seu olhar para o multiculturalismo. Como os jovens explicam esse fenômeno? Provavelmente alguns responderão que, nas últimas décadas, países como a França e a Alemanha passaram a receber imigrantes, que hoje estão presentes nas equipes esportivas. Lembre que isso também ocorreu, no final do século 19 e início do século 20, em países como a Argentina, o Uruguai e o Brasil - que, bem ou mal, conseguiram superar preconceitos de todo tipo e forjar equipes nacionais. 
Explique à turma que, entre estes preconceitos, estava o racismo. Para se ter uma ideia, em 1924, o Vasco da Gama impediu que os grandes clubes cariocas afastassem os jogadores pobres - em sua grande maioria, negros e mulatos -, sob a alegação de que "praticavam o profissionalismo". Questione os alunos se essa fusão de etnias também ocorre na Europa. A construção da nacionalidade teve mais êxito nos países americanos de imigração ou no Velho Mundo, onde surgiu justamente o conceito de Estado Nacional? 
Encarregue os estudantes de investigar o processo de construção do Estado Nacional em países como a França e a Espanha. Será possível verificar que, muito antes da chegada dos imigrantes, um grupo étnico dominante conseguiu incorporar, num só corpo político, outras etnias. No caso francês, foram conquistados territórios meridionais de idioma provençal como a Bretanha e, já no século 17, a Alsácia e a Lorena, onde se falavam línguas germânicas. O núcleo castelhano da Península Ibérica, por sua vez, conseguiu dominar as regiões bascas e a Catalunha - todas elas dotadas de língua e cultura próprias, bem como a Andaluzia, de forte presença moura. Durante as comemorações da vitória espanhola na Copa do Mundo de 2010, atletas catalães erguiam a bandeira de sua pátria - a Catalunha, não a Espanha -, enquanto outros empunhavam pavilhões bascos e da Andaluzia. É uma evidência de que existem realidades étnicas que reivindicam, se não a independência plena, pelo menos maior autonomia no âmbito do Estado Nacional Espanhol.
Estabeleça alguns tópicos para pesquisa e debate. Foi apenas a força que conservou unidas essas diferentes etnias, ou o grupo dominante ofereceu a participação em um projeto "nacional" que lhe assegurou a hegemonia? Na França, esse projeto foi marcado pela Revolução de 1789, que forjou uma nova unidade na República com base na afirmação dos direitos de cidadania. As palavras da vice-ministra dos Esportes podem ser vistas como uma reafirmação desses direitos? 
Ressalte o potencial unificador do processo revolucionário francês: a Marselhesa foi composta em 1792 na Alsácia, com o título de Canto de Guerra para o Exército do Reno, ou seja, em um território que só passou a fazer parte da França no reinado de Luís 14. Será que na atualidade existe um projeto nacional capaz de unir, segundo Roberto Pompeu de Toledo, "uma seleção dividida em facções em que tiveram peso a origem, a cor da pele e a religião"? A julgar pelos atentados racistas contra a seleção francesa, exigindo uma equipe "branca e cristã", as perspectivas não parecem muito promissoras - e ainda menos no tocante à incorporação das famílias de imigrantes à nação francesa. 


2ª aula
Peça que a moçada relacione as passagens a seguir aos conceitos de chauvinismo, ufanismo, jingoísmo, patriotismo "ortodoxo", patriotismo "dinâmico" e nacionalismo, apresentados na aula anterior.
1.        "Eu também já fui brasileiro
moreno como vocês.
Ponteei viola, guiei forde
e aprendi na mesa dos bares
que o nacionalismo é uma virtude.
Mas há uma hora em que os bares se fecham
e todas as virtudes se negam."
(Carlos Drummond de Andrade, Também já fui brasileiro. Do livro Alguma poesia)

2.        "My country, right or wrong" (Certo ou errado, o meu país").

3.        "A língua é minha Pátria / E eu não tenho Pátria: tenho mátria / Eu quero frátria" (Caetano Veloso, Língua)

4.        "Brasil, ame-o ou deixe-o"
Propaganda governamental do governo Médici (1969-1974)

5.        "A seleção é a pátria em chuteiras"
Nelson Rodrigues

6.        "Fui e fiz meu trabalho. Tiraram sarro, disseram que eu fui patriota. Hoje os jogadores são patriotas, resgataram o orgulho e o respeito pela camisa, o moral"
Dunga, ex-técnico da seleção brasileira de futebol, em entrevista realizada em 9 de julho de 2010.

7.        "Que a vossa geração exceda a minha e as precedentes, senão em semelhante amor, ao menos nas ocasiões de o comprovar. Quando disserdes: ‘Somos brasileiros!’ levantai a cabeça, transbordantes de nobre ufania. Convencei-vos de que deveis agradecer quotidianamente a Deus o haver Ele vos outorgado por berço o Brasil".
(Afonso Celso, Por que me ufano de meu país)

Aproveite as citações para discutir com a turma as noções de patriotismo. Questione os alunos sobre o que é o mais indicado: que um treinador de futebol monte uma seleção de patriotas ou uma boa equipe? A camisa da seleção canarinho é um dos símbolos da pátria, ao lado das chuteiras presentes nas crônicas de Nelson Rodrigues? Dunga investia contra a "imprensa impatriótica", assim como a direita francesa atacava os jogadores negros e muçulmanos. Será que nos dois casos não são justificativas para a montagem de equipes que exibiram um futebol inferior ao esperado? Promova um debate com a turma e, ao final, peça para que todos escrevam textos dissertativos a respeito.

Avaliação
No decorrer dos debates, a classe deve perceber que o patriotismo não pode ser imposto. Quanto à atividade da segunda aula, espera-se a identificação dos seguintes conceitos, pela ordem em que os textos e frases aparecem neste plano de aula: nacionalismo, jingoísmo, patriotismo "dinâmico", chauvinismo, patriotismo "ortodoxo" (Nelson Rodrigues e Dunga) e ufanismo. Os textos produzidos pelos estudantes também servem como base para esta avaliação.

Consultoria Carlos Eduardo Matos
Jornalista e editor de livros didáticos e paradidáticos.



http://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/patriotismo-nacionalismo-577927.shtml

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