Crônica: gênero entre o jornalismo e a
literatura
Aproveite
o centenário do cronista Rubem Braga (1913-1990) para discutir com a turma as
características do gênero que o consagrou, estimulando a leitura e a produção
de textos
Objetivos
-
Identificar as características da crônica como gênero híbrido entre o
jornalismo e a literatura
-
Observar as reflexões e digressões líricas, humorísticas, sociais e políticas
contidas nas crônicas
- Ler
crônicas de autores consagrados
-
Produzir crônicas a partir dos estudos realizados
Conteúdos
-
Gêneros literários e jornalísticos: crônica
Tempo estimado Seis aulas
Anos 8° e 9° anos
Materiais necessários
- Caderno e papel;
- Cópias das seguintes
crônicas:
Do livro Seleta de Prosa,
de Manuel Bandeira (Ed. Nova Fronteira, 592 págs.,21/3882-8200):
"Candomblé"
Do livro 200 Crônicas
Escolhidas, de Rubem Braga (Ed. Record, 490 págs., 37,90 reais, 21/2585-2000):
"Moscas, e Teto Azul" e "Buchada de Carneiro"
Do livro Crônicas para Ler
na Escola, de Carlos Heitor Cony (Ed. Objetiva, 160 págs., 35,90 reais,
21/2199-7824): "Agulhas de Hiroshima"
Introdução
O
nascimento da crônica moderna se deu entre os séculos 14 e 15, em Portugal.
Como cronista real, Fernão Lopes (1380?- 1460?), guarda-mor da Torre do Tombo
em Portugal, tinha o papel de registrar e arquivar a cronologia dos reinados e
de toda a história das dinastias portuguesas. Lopes foi o primeiro a produzir
textos com características modernas: a autoridade das informações advinha da
referência documental, o autor mantinha-se distante e neutro em relação aos
fatos, buscando narrar a realidade afastado das emoções e subjetividades. O
gênero tinha, então, um viés historiográfico.
A
partir do século 19, através de sua difusão no meio jornalístico, os autores
passam a utilizar a crônica como meio de análise subjetivos de acontecimentos
cotidianos, comentando temas próximos aos leitores de jornal.
No
Brasil, o caráter mais breve e informal do gênero permitiu que ele fosse
utilizado como espaço de exercício para grandes autores como José de Alencar,
Manuel Antonio de Almeida, Raul Pompéia e Machado de Assis no século 10 e
Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Manuel Bandeira, Nelson
Rodrigues, João do Rio, Lima Barreto, Fernando Sabino, entre outros do século
20. Entretanto, grandes escritores tiveram seu talento reconhecido por conta de
textos do gênero que publicavam nas páginas de jornais e revistas, como Luís
Fernando Veríssimo, Carlos Heitor Cony e Mário Prata.
Destes,
Rubem Braga (1913-1990) é o principal representante. Seu trabalho, publicado ao
longo de sua vida em diversos jornais, compilações e antologias, acabou por
elevar a crônica ao patamar de grande literatura. O centenário do autor pode
ser uma boa oportunidade para explorar com a turma as principais
características do gênero, estimulando a produção de textos.
Leia Mais
Desenvolvimento
1ª etapa
1ª etapa
Procure
descobrir o que os alunos já sabem sobre o gênero e como se relacionam com ele.
Pergunte se costumam ler textos desse tipo, se reconhecem algumas de suas
características e se conhecem alguns autores.
Explique
que a origem da palavra crônica está ligada à noção de tempo. Chame a atenção
para palavras que possuem a mesma raiz, como cronograma, cronômetro e
cronologia. No gênero, essa relação com o tempo se mostra tanto na brevidade
dos textos quanto no fato de ele se basear em acontecimentos cotidianos.
Conclua
a apresentação do gênero, destacando sua aproximação tanto de textos
jornalísticos quanto da literatura. De um, ele herda a brevidade, a aproximação
com o leitor e o embasamento em fatos cotidianos. Do outro, o lirismo, o humor,
a subjetividade e a elaboração da linguagem.
2ª etapa
Leia
com os alunos a crônica "Moscas, e Teto Azul", retirada do livro 200
Crônicas Escolhidas. Discuta o texto, estimulando os alunos a notarem algumas
das principais características do gênero e que estão presentes, como a ironia,
o lirismo e a subjetividade.
O
principal traço a ser destacado é a forma breve - mas não superficial -
utilizada para refletir sobre acontecimentos comuns: a partir da sugestão de
pintar seu teto de azul, o autor trata de grandes temas como amor, vida e
morte.
Outro
elemento a ser destacado é o uso de ironia. Esse recurso se apresenta logo no
início do texto, quando o narrador questiona quem teria sido o descobridor
deste "delicadíssimo segredo da construção civil" (o fato de moscas
não gostarem de azul) e permeia todo o texto.
A
aproximação do leitor é outro ponto que deve ser notado. Isso fica expresso na
passagem em que o narrador se dirige diretamente a quem está lendo: assume
estar falando "bobagens", questiona se é possível prender um amor
como quem prende um passarinho, culmina de forma resignada falando da própria
morte e comparando-se a uma mosca que recua diante de um teto pintado de azul.
Após os
comentários, peça que os alunos relembrem um fato aparentemente banal e
cotidiano que eles tenham vivido e que possam servir como mote para uma
crônica. Peça que registrem em seus cadernos as possibilidades e temas em que
pensaram.
Oriente-os,
então, a produzir um parágrafo de tom narrativo, usando alguma das ideias
listadas. Ao final, peça que alguns alunos leiam para a classe o que produziram
e estimule a classe a comentar os trechos lidos. Finalize a aula orientando que
os alunos desenvolvam uma crônica a partir do parágrafo narrativo criado em
sala. Lembre-os da importância de usar as características discutidas em sala e
de dar um título criativo ao texto.
Inicie
a aula seguinte pedindo que alguns alunos, voluntariamente, leiam a crônica
produzida. Peça que os próprios autores e a turma comentem as produções. Note,
por exemplo, se os alunos utilizaram o evento cotidiano listado anteriormente
como ponto de partida para uma reflexão.
3ª etapa
A
seguir, distribua para os alunos a crônica "Candomblé" do livro Seleta
de Prosa. Antes de pedir a leitura, apresente algumas informações sobre o
texto: ele trata, de maneira peculiar, detalhista e bem humorada, a visita que
ele e outros três amigos fazem a um ritual. Destaque a descrição feita pelo
autor do espanto de um dos amigos, que é estrangeiro, diante dos
acontecimentos.
Depois
da leitura, retome algumas características observadas anteriormente, como a
brevidade e a ironia. Dê atenção especial ao nível de detalhamento dado pelo
autor tanto às reações do colega quanto às condições em que ele acontece.
Explique que essa característica aproxima a crônica atual da sua função
inicial, na historiografia: descrever um evento social que possa servir para
analisar a sociedade que o pratica.
4ª etapa
A
seguir, distribua o texto "Buchada de Carneiro", escrito por Rubem
Braga e presente também no livro200 Crônicas Escolhidas. Peça que a turma leia
silenciosamente e, em seguida, proponha uma discussão sobre quais elementos já
estudados estão presentes.
Destaque
novamente como o narrador se dirige diretamente a uma leitora, justificando o
teor da narrativa por conta de ser ele um "repórter fiel" que precisa
contar tudo. Observe a presença da ironia, que culmina em um sutil humor-negro,
que permeia o texto como um todo, e também, como no texto de Bandeira, a rica
descrição dos acontecimentos.
Finalize
orientando seus alunos a planejarem um esboço de uma crônica narrativa, a ser
produzida como trabalho de casa. Oriente-os a produzir textos com riqueza de
detalhes, e também que procurem usar da ironia e humor como recursos para a
produção do texto. Lembre-os que o acontecimento pode ser algo que eles
vivenciaram ou presenciaram, mas que deve conter uma reflexão que possa ser
compartilhada com outros leitores.
Inicie
a aula seguinte com a leitura de alguns textos pela turma. Observe se os
elementos do humor, da ironia, da reflexão, do detalhismo e da narrativa estão
presentes nas produções e comente com os autores, dando a oportunidade para que
as reescrevam.
5ª etapa
Explique
aos alunos que as crônicas não são apenas reflexões sobre o cotidiano, mas
também podem tratar de temas graves, como política. Distribua então os textos
"Agulhas de Hiroshima", de Carlos Heitor Cony, e
"Imigração", de Rubem Braga.
Em
"Imigração", o tema é a política oficial de imigração vista sob uma
perspectiva crítica, sugerindo maior atenção aos imigrantes pobres que vêm para
o Brasil. Apesar de ter sido escrito em 1952, sua reflexão continua pertinente
no Brasil de hoje, que recebe milhares de imigrantes em situação semelhante à
narrada no texto de Braga. Em "Agulhas de Hiroshima", Carlos Heitor
Cony conta seu encontro inesperado com o acupunturista Tada. Sobrevivente da
bomba atômica, o japonês radicado no Brasil narra a tragédia de Hiroshima sob a
lembrança de uma criança de seis anos que viu "o Sol nascer da terra"
(uma referência à explosão da bomba) e matar todos os que estavam ao seu redor.
O oriental conclui que a causa da tragédia e da tristeza é a política, opinião
compartilhada com o cronista.
Peça
aos alunos que comentem e comparem os dois textos. Em seguida, listem em grupo
alguns dos elementos característicos do gênero que estejam presentes nos
textos. Como tarefa para casa, peça que eles utilizem manifestações recentes
como gancho para a produção de uma crônica de tom político.
Na aula
seguinte, peça que alguns alunos compartilhem seu trabalho com os colegas, que
podem comentar as produções. Finalize o trabalho, pedindo o auxílio da turma
para listar os conteúdos estudados, como as características típicas do gênero
crônica e as relações com o jornalismo e a literatura.
Produto final
Com a
produção dos alunos, produza um fanzine ou publique-os em um blog. Algumas
ferramentas que permitem a publicação gratuita de conteúdo na internet são o Wordpress.com, o Blogger e o Tumblr.
Avaliação
A
partir dos textos produzidos e do debate realizado em sala, observe se os
alunos foram capazes de compreender a crônica como gênero híbrido entre o
jornalismo e a literatura; contextualizar a evolução do gênero, de suas origens
à produção contemporânea; compreender as características reflexivas, digressivas,
humorísticas, líricas, sociais, historiográficas, políticas encontradas nas
crônicas; analisar a obra de autores consagrados e produzir crônicas cada vez
melhores a partir das leituras e dos estudos realizados.
Quer saber mais?
Coletâneas de crônicas
Contos
e Crônicas para ler na escola (João Ubaldo Ribeiro, Ed. Objetiva, 200
págs., 36,90 reais, 21/2199-7824 )
Comédias para se ler na escola (Luís Fernando Veríssimo, Ed. Objetiva, 148 págs., 36,90 reais, 21/2199-7824 )
Seleta de Prosa (Manuel Bandeira, Ed. Nova Fronteira, 592 págs.,21/3882-8200)
Comédias para se ler na escola (Luís Fernando Veríssimo, Ed. Objetiva, 148 págs., 36,90 reais, 21/2199-7824 )
Seleta de Prosa (Manuel Bandeira, Ed. Nova Fronteira, 592 págs.,21/3882-8200)
200
Crônicas Escolhidas (Rubem Braga, Ed. Record, 490 págs., 37,90 reais,
21/2585-2000)
Crônicas
para Ler na Escola (Carlos Heitor Cony, Ed. Objetiva, 160 págs., 35,90
reais, 21/2199-782
André Rosa
Professor de Literatura, mestre em Educação e integrante da equipe do programa Futuro Integral (SESC/PR)
Professor de Literatura, mestre em Educação e integrante da equipe do programa Futuro Integral (SESC/PR)
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